Estudo aponta alterações cerebrais e no sangue de pessoas que cometeram suicídio; entenda

Pesquisa coordenada por professora da UFSC busca identificar fatores suscetíveis a comportamentos suicidas, além de potenciais alvos para tratamento. G1 Uma pesquisa coordenada pela neurocientista Manuella Kaster, professora da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), e publicada na revista Psychiatry Research, identificou alterações moleculares no cérebro e no sangue de indivíduos que cometeram suicídio. O estudo, feito a partir da reanálise de pesquisas já existentes (entenda mais abaixo), comparou materiais de vítimas de suicídio e de indivíduos que morreram por outras causas, geralmente não violentas. ✅Clique e siga o canal do g1 SC no WhatsApp Segundo Kaster, as conclusões apontam que comportamentos suicidas podem estar relacionados também a questões fisiológicas, e não apenas a fatores psicológicos e sociais. A especialista, que dividiu a coordenação com Daniel Martins de Souza, professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), afirma que estudar e compreender mais o tema pode, em breve, ajudar na prevenção de suicídios. "Os aspectos sociais e psicológicos são, com certeza, fundamentais. Mas o comportamento é, em última análise, derivado de respostas moleculares e atividade celular em regiões cerebrais específicas", explica. O que se sabe hoje Para a psiquiatra Deisy Mendes Porto, presidente da Associação Catarinense de Psiquiatria (ACP), e que atuou como coordenadora de Saúde Mental na Secretária de Saúde de Santa Catarina, o suicídio é multifatorial. Ela destaca, no entanto, que a medicina ainda vê a presença de transtornos mentais como o principal fator de risco para esse tipo de comportamento. O resultado da nova publicação, segundo ela, "traz mais uma direção" para futuros tratamentos. "Ainda temos apenas estudos [que relacionam suicídio com alterações moleculares], como o citado, apesar de muita pesquisa sobre o tema nos últimos anos. Por enquanto, não existe nenhum exame, seja de sangue ou de imagem cerebral, que apresente características inequívocas de risco de suicídio para que possamos usar isso clinicamente", explica. Já a psiquiatra Vanessa Leal afirma que a prevenção hoje, na medicina, se dá com atendimentos de qualidade, orientação a redes de apoio, além da boa formação médica para rápida identificação de problemas. "Outro fator de risco com relevância para mencionar é a tentativa de suicídio prévia. Sabemos que é um fator importante e independente, ou seja, não depende da presença do transtorno mental", afirma. A pesquisadora Manuella Kaster destaca que o caminho ainda é longo para que as novas conclusões sejam aplicadas em consultório. Primeiro, segundo a neurocientista, o grupo tenta entender as bases biológicas do comportamento e todas as alterações moleculares associadas a ele. "Mas, com certeza, essa compreensão é o primeiro passo para o desenvolvimento de estratégias capazes de integrar a prática clínica", detalha. Estudo americano aponta principais causas de suicídio entre os médicos Suicídios de adolescentes: como entender os motivos e lidar com o fato O estudo Para chegarem às conclusões, os pesquisadores revisaram e reanalisaram dados de 17 pesquisas já existentes que avaliam alterações moleculares no sangue e no cérebro, após a morte, de indivíduos que cometeram suicídio. Os estudos sobre o tema, conforme Kaster, são escassos por causa das dificuldades intrínsecas de acesso a este tipo de amostra biológica. E, quando avaliados isoladamente, as conclusões são mais limitadas. O córtex pré-frontal foi a área do cérebro mais verificada nos trabalhos identificados pela equipe. O resultado sugere que alterações na estrutura dessa região cerebral, fundamental nos processos de tomada de decisão e flexibilidade comportamental, podem ser relevantes no contexto do comportamento suicida. "O nosso trabalho agrupou os dados dos diferentes trabalhos, e através de ferramentas computacionais, compiladas em algoritmo desenvolvido pelo aluno de doutorado do Laboratório de Neuroproteômica da Unicamp Guilherme Reis de Oliveira, foi possível identificar alguns mecanismos biológicos e alterações celulares comuns associadas ao suicídio", informou Kaster. Alterações Das vias comuns, os pesquisadores da UFSC e Unicamp identificaram alterações em sistemas de neurotransmissores, em vias envolvidas nos processos de obtenção e utilização de energia pelas células e em mecanismos de neuroplasticidade e comunicação celular. As alterações moleculares foram principalmente associadas a células gliais, que integram o tecido nervoso e têm interação próxima e dinâmica com os neurônios. Conforme o estudo, elas são fundamentais no controle da comunicação celular, metabolismo e plasticidade. Suicídio: existe algum sinal? Como prevenir e conversar com meu filho sobre o tema? A análise dos dados mostrou ainda modificações em fatores de transcrição, que são moléculas responsáveis pela regulação da expressão de diversos genes, ou seja, que dizem o que outros genes têm de fazer. Conforme Kaster, o

Mar 8, 2024 - 17:37
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Estudo aponta alterações cerebrais e no sangue de pessoas que cometeram suicídio; entenda

Pesquisa coordenada por professora da UFSC busca identificar fatores suscetíveis a comportamentos suicidas, além de potenciais alvos para tratamento. G1 Uma pesquisa coordenada pela neurocientista Manuella Kaster, professora da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), e publicada na revista Psychiatry Research, identificou alterações moleculares no cérebro e no sangue de indivíduos que cometeram suicídio. O estudo, feito a partir da reanálise de pesquisas já existentes (entenda mais abaixo), comparou materiais de vítimas de suicídio e de indivíduos que morreram por outras causas, geralmente não violentas. ✅Clique e siga o canal do g1 SC no WhatsApp Segundo Kaster, as conclusões apontam que comportamentos suicidas podem estar relacionados também a questões fisiológicas, e não apenas a fatores psicológicos e sociais. A especialista, que dividiu a coordenação com Daniel Martins de Souza, professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), afirma que estudar e compreender mais o tema pode, em breve, ajudar na prevenção de suicídios. "Os aspectos sociais e psicológicos são, com certeza, fundamentais. Mas o comportamento é, em última análise, derivado de respostas moleculares e atividade celular em regiões cerebrais específicas", explica. O que se sabe hoje Para a psiquiatra Deisy Mendes Porto, presidente da Associação Catarinense de Psiquiatria (ACP), e que atuou como coordenadora de Saúde Mental na Secretária de Saúde de Santa Catarina, o suicídio é multifatorial. Ela destaca, no entanto, que a medicina ainda vê a presença de transtornos mentais como o principal fator de risco para esse tipo de comportamento. O resultado da nova publicação, segundo ela, "traz mais uma direção" para futuros tratamentos. "Ainda temos apenas estudos [que relacionam suicídio com alterações moleculares], como o citado, apesar de muita pesquisa sobre o tema nos últimos anos. Por enquanto, não existe nenhum exame, seja de sangue ou de imagem cerebral, que apresente características inequívocas de risco de suicídio para que possamos usar isso clinicamente", explica. Já a psiquiatra Vanessa Leal afirma que a prevenção hoje, na medicina, se dá com atendimentos de qualidade, orientação a redes de apoio, além da boa formação médica para rápida identificação de problemas. "Outro fator de risco com relevância para mencionar é a tentativa de suicídio prévia. Sabemos que é um fator importante e independente, ou seja, não depende da presença do transtorno mental", afirma. A pesquisadora Manuella Kaster destaca que o caminho ainda é longo para que as novas conclusões sejam aplicadas em consultório. Primeiro, segundo a neurocientista, o grupo tenta entender as bases biológicas do comportamento e todas as alterações moleculares associadas a ele. "Mas, com certeza, essa compreensão é o primeiro passo para o desenvolvimento de estratégias capazes de integrar a prática clínica", detalha. Estudo americano aponta principais causas de suicídio entre os médicos Suicídios de adolescentes: como entender os motivos e lidar com o fato O estudo Para chegarem às conclusões, os pesquisadores revisaram e reanalisaram dados de 17 pesquisas já existentes que avaliam alterações moleculares no sangue e no cérebro, após a morte, de indivíduos que cometeram suicídio. Os estudos sobre o tema, conforme Kaster, são escassos por causa das dificuldades intrínsecas de acesso a este tipo de amostra biológica. E, quando avaliados isoladamente, as conclusões são mais limitadas. O córtex pré-frontal foi a área do cérebro mais verificada nos trabalhos identificados pela equipe. O resultado sugere que alterações na estrutura dessa região cerebral, fundamental nos processos de tomada de decisão e flexibilidade comportamental, podem ser relevantes no contexto do comportamento suicida. "O nosso trabalho agrupou os dados dos diferentes trabalhos, e através de ferramentas computacionais, compiladas em algoritmo desenvolvido pelo aluno de doutorado do Laboratório de Neuroproteômica da Unicamp Guilherme Reis de Oliveira, foi possível identificar alguns mecanismos biológicos e alterações celulares comuns associadas ao suicídio", informou Kaster. Alterações Das vias comuns, os pesquisadores da UFSC e Unicamp identificaram alterações em sistemas de neurotransmissores, em vias envolvidas nos processos de obtenção e utilização de energia pelas células e em mecanismos de neuroplasticidade e comunicação celular. As alterações moleculares foram principalmente associadas a células gliais, que integram o tecido nervoso e têm interação próxima e dinâmica com os neurônios. Conforme o estudo, elas são fundamentais no controle da comunicação celular, metabolismo e plasticidade. Suicídio: existe algum sinal? Como prevenir e conversar com meu filho sobre o tema? A análise dos dados mostrou ainda modificações em fatores de transcrição, que são moléculas responsáveis pela regulação da expressão de diversos genes, ou seja, que dizem o que outros genes têm de fazer. Conforme Kaster, o projeto segue em andamento. "Atualmente estamos trabalhando em duas linhas. A primeira, com a avaliação de marcadores no sangue de pacientes com e sem risco de suicídio, trabalho ainda em andamento que também conta com a colaboração do Dr. Daniel Martins de Souza, da Unicamp", afirma. A segunda parte compreende uma avaliação das bases de dados públicas do sistema DataSUS, mantido pelo Ministério da Saúde, e do IBGE. A ideia, conforme a pesquisadora, é avaliar os principais fatores sociodemográficos, de saúde e infraestrutura associados ao risco de suicídio nos municípios da região Sul do país. ✅Clique e siga o canal do g1 SC no WhatsApp VÍDEOS: mais assistidos do g1 SC nos últimos 7 dias

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